quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

A Ira de Deus, O Grande Terramoto de Lisboa de 1755

 


Sábado, 1 de Novembro de 1755, dia de Todos-os-Santos. Em Lisboa, a quarta maior cidade da Europa e a opulenta metrópole do grande império português, o dia amanhecera luminoso e quente. Poucos minutos depois das nove e meia, um barulho horrível anunciou uma das catástrofes mais devastadoras que alguma vez assolaram uma cidade importante no mundo ocidental.
A duração de dez minutos do Grande Terramoto de Lisboa raramente foi igualada. A magnitude do maior dos três tremores foi de 8,75-9 na escala de Richter. Seguiram-se duas réplicas fortes bem como um enorme maremoto. A destruição ficou completa com um incêndio que lavrou durante uma semana, consumindo uma área superior à do Grande Incêndio de Londres. Perdeu-se a maior parte do imenso recheio valioso existente nos palácios, igrejas e armazéns de Lisboa. Morreram entre quarenta a cinquenta mil pessoas em Lisboa.
Inspirando-se em fontes capitais, muitas das quais nunca antes utilizadas, Edward Paice pinta um retrato vívido de uma cidade e de uma sociedade transformadas para sempre no espaço de escassos minutos. A Ira de Deus é uma descrição emocionante feita por um escritor de excelência de um desastre natural recordado um século mais tarde como ‘a catástrofe mais temível que a história regista’.


Toda a narrativa, trazida até nós pela mestria deste autor, nasce dos olhos de quem assistiu à cena desde o palco e não em camarotes ou plateias. Pelas descrições dos mercadores ingleses e alguns diplomatas, também ingleses, que viviam em Lisboa naquela altura, temos um relato da catástrofe na primeira pessoa.

Esta narrativa de uma grande riqueza e quase poética, inicia-se com a descrição da vista de Lisboa pelos olhos que quem entra na barra e segue de barco pelo Tejo acima, mostrando ao leitor os edificios, monumentos e tudo o que daquele local se conseguia ver. Mais à frente, numa mostra da sociedade da época, com algumas críticas negativas, também nos são dados vislumbres da vida dos portugueses a par da vida da comunidade inglesa que então residia em Lisboa. A maior parte residia em Lisboa por negócios, alguns por assuntos diplomáticos e outros por motivos de saúde.

Quando o terramoto acontece, vamos assistindo à sua ação devastadora na cidade, conforme os locais onde estavam no momento as pessoas que os narraram.

De uma forma tão clara e sem subterfúgios, sentimo-nos presentes nos vários momentos e sentimos as ondas de destruição também sobre nós, o que, tal como o autor referiu muita vez, ao expressar os questionamentos das pessoas envolvidas, nos faz questionar não sobre "onde está Deus que permite tamanha destruição?", mas "quem pode subsistir à ira de Deus?". Não sendo um livro sobre religião, nem sobre Deus, mas sim sobre uma das maiores catátrofes já ocorridas, os questionamentos, nesta narrativa, refletem uma sociedade temente e submissa a Deus, nem que fosse apenas nos momentos de aflição e esse temor e submissão não passasse de terror pelo Seu juízo e aceitação da Sua vontade que não se podia contrariar mas nunca chegasse a ser respeito ou reverência.

Outra nota que gostaria de acrescentar é que este livro leva-nos a locais bastante distantes de Lisboa onde a ação dos abalos e das ondas do maremoto se fizeram sentir. Tinha noção, pelos livros de história, de que fora grande a distância percorrida pela catástrofe, mas nunca pensei que fosse tão alargada.

Recomendo vivamente. Eu li o livro em inglês, mas acredito que o tradutor conseguiu transmitir cada momento da mesma forma, até porque, se há lingua rica é a nossa.