sexta-feira, 24 de junho de 2022

Fanny Owen

 


Fanny Owen é a história de um amor proibido entre José Augusto, jovem rico herdeiro das vinhas do Douro e amigo de Camilo Castelo Branco (que é também um dos personagens centrais deste livro) e Fanny Owen, filha do General Owen, um dos conselheiros do Rei, por quem Camilo tem também uma profunda paixão. Tudo isto na sociedade burguesa oitocentista portuense, com algumas viagens regulares ao Douro vinhateiro e ao Minho.

Poderemos considerar este romance como um "romance de personagem", o seu nome assim nos leva a essa conclusão, mas, no entanto, os personagens mais presentes, do início ao fim, são José Augusto e Camilo Castelo Branco. Fanny é a razão para o nome e para toda a situação que este romance narra, mas quanto a mim, não é o assunto principal do romance.

Também podemos considerar este, como um romance de espaço. Está dividido em três partes, devido aos locais onde a ação se passa e cada um deles a par da descrição feita pela autora, é-nos descrito sob o ponto de vista de Camilo, quando está presente.

Considerado a história de um triangulo amoroso, pelo relacionamento e a paixão de Camilo por Fanny no momento em que José Augusto decide (ou é levado a decidir) que a ama e a quer, se o fosse, rompeu-se esse triângulo quando Camilo diz a José Augusto que deixou de amar Fanny e lhe pede que ele se afaste dela, porque a vai destruir.

Este romance é uma narrativa da vida social da burguesia, nos finais do séc. XIX que nos conta os amores infelizes (ou funestos) das três personagens: José Augusto que se volta para Fanny porque a entrega e admiração de Maria por si o enfadava e retirava a vontade de a amar; Fanny que cansada da vida na casa paterna e desejosa de amar convence José Augusto a raptá-la para escapar; e Camilo que confessa que a amou a dada altura mas que o amor deles não passou de um "amor epistolar", em cartas que entrega a José Augusto no dia do casamento deste com Fanny.

Por isso, ou porque de facto o amor nunca existiu entre os dois, a vida do casal vai ser dor e desencanto apesar da obsessão de um pelo outro, nem que fosse pelo simples facto de existirem e estarem juntos.

No entanto, e aqui a minha singela opinião que como todas as opiniões pessoais, vale o que vale, este é um romance que versa sobretudo sobre o relacionamento de dois homens completamente diferentes um do outro e que a vida se encarrega de por frente a frente e sujeitá-los aos seus constrangimentos.

José Augusto é um pseudo poeta, fidalgo, com uma forma de estar que não é recomendável desafiar, pelo seu feitio sisudo e pouco dado a manifestações de simples alegria. Camilo por sua vez é um verdadeiro poeta, com uma história familiar muito própria e algo devassa. Os encontros entre os dois nem sempre terminam da melhor maneira, no entanto, acabam sempre por se reencontrar e desejarem redimir-se dos males que se tenham causado. A tal ponto, o relacionamento é importante para eles que mesmo quando Fanny pede a José Augusto que se afaste de Camilo porque a relação entre os dois, alimenta uma prossível traição de José Augusto com uma amiga dos dois homens, José Augusto não o faz.

Não é um relacionamento de amor eros que os une, mas um amor agape ou phillia, alimentado pelas diferenças entre os dois, como se só com esse relacionamento se completassem. Como se a falta de um provocasse no outro a falta de algo maior.

A narrativa de Agustina Bessa-Luís é detalhada e demorada e faz-nos perder nos meandros dos espaços e da ação, com a demora que pode em alguns casos aborrecer um leitor que espere ação no verdadeiro sentido da palavra. É para ler sem pressa e deixar que o ambiente e a realidade oitocentistas nos envolvam. A última parte, as cenas entre José Augusto e Fanny são sobremaneira demoradas e como se repetidas, mas ajudam-nos a entender o sentimento de cada um deles. Percebemos que amam sem se amarem um ao outro e que a rutura provocada com a morte de Fanny, é ainda assim fatal para José Augusto. É Camilo quem nos conta pelas palavras da autora.