quarta-feira, 5 de setembro de 2018

O Boi que Guardava o Sábado (conclusão)


Certo de que tinha a atuação célere e despachada do boi na sexta feira passada, fora apenas um acaso de sorte e conformado se a vontade de Deus era que ele passasse os Sábados enclausurado Nickolai, naquela sexta-feira, só se levantou quando, ainda antes da formatura - obrigatória em cada manhã - vieram chamá-lo para que fosse ao estábulo, pois uma coisa estava a acontecer.

Nickolai chegou ao estábulo e viu Maksim numa inquietação ainda maior que a da semana anterior. Coiceava e dava marradas em tudo o que parecesse estar no seu caminho, como se desejasse sair dali.
Não acreditando no que via, Nickolai atrelou-o à carroça com os barris vazios e mal deu por isso, já o boi se punha em corrida para fora do campo e Nickolai teve que voltar a correr para o acompanhar, sentindo que afinal o acaso da semana passada, era a mão de Deus na sua vida, e agradecendo em pensamento.

Todo o dia foi uma repetição da sexta-feira passada, mas desta vez à saída depois do meio dia para a tarefa da tarde, o cozinheiro que já contava com a situação tinha um farnel para que Nickolai comesse alguma coisa no caminho, mesmo que fosse em passo de corrida.

E o fim do dia chegou com a quota da água dobrada e o Sábado foi dia de descanso para os dois.

Durante oito anos, as semanas sucediam-se desta forma e apesar da repetição, as sextas feiras eram sempre motivo de boa disposição entre os prisioneiros e os guardas.

Um dia, o mesmo oficial com quem Nickolai fizera o acordo, voltou a visitar o campo e ao tomar conhecimento do que estava a acontecer, ordenou que o prisioneiro fosse libertado e no mesmo dia Nickolai viu-se a caminho do comboio que o levaria de volta a casa.

Com a chegada de novos prisioneiros, foi decidido que o trabalho de ir buscar água à nascente, seria tarefa de um dos novos, já que mais ninguém gostava de o fazer, e o novo prisioneiro, limitava-se a seguir o boi que conhecia o caminho e aproveitava para ir na carroça, enquanto os barris estavam vazios, caminhando apenas na volta, quando já vinham cheios e não convinha cansar demais o animal.

Chegou a sexta-feira e quando se ia preparar para se montar na carroça e fazer a sua viagem regalado, Maksim começou a sua corrida das sextas-feiras. Os outros prisioneiros divertidos, entraram em gargalhada geral com a aflição do novo prisioneiro que desatou a correr em desespero atrás do boi.
Nenhum lhe havia contado o que costuma passar-se, por curiosidade em ver se agora que Nickolai não estava, o boi mantinha o hábito de dobrar o trabalho na sexta, e para ver a atrapalhação do outro se isso acontecesse.

Cada vez que a carroça voltava ao campo, o prisioneiro chegava sem fólego, quase sem conseguir respirar - afinal não estava habituado a fazer os quilómetros que distavam o campo da nascente, num passo de corrida e quando finalmente o boi parou no final do dia e ainda sob as gargalhadas dos companheiros, o prisioneiro só dizia entre golfadas de ar:
- Desisto! O boi está possesso! Não há outra explicação!
- Há sim! - ouviu-se uma voz ali perto e todos viram o diretor parado ali perto. - Sabe, aquele pregador de Kiev treinou o velho Maksim durante anos. Nickolai Panchuck recusava-se a trabalhar no sétimo dia de cada semana e estragou o boi com esse negócio. Arruinou-o e ele nunca mais será o mesmo! - O diretor olhou em redor para os outros homens e de novo para o prisioneiro novo - Não tenho dúvida nenhuma. Aquele pregador tornou o boi um guardador do sábado.


E tornou mesmo. Mas não tinha sido obra de Nickolai. Nickolai correra lado a lado com Maksim durante todos aqueles anos para transportar água que fosse suficiente para o sábado. E sempre fora necessária uma sexta-feira de maratona para completar o serviço a cada semana.
O crédito por um fenómeno desses era todo de Deus e Nickolai dizia isso a todos os que quisessem saber a verdade.
Mesmo depois de Nickolai ter saído do campo de prisioneiros para a sua família, a influência da sua vida correta, prosseguiu pelo testemunho de um boi. Maksim continuou fiel aos seus deveres, pronto a ser usado pelo Criador como testemunha em favor do sábado.

2 comentários:

Patricia Merella disse...

Bom Domingo amiga Maria! Beijinhos

José Marcos Serra disse...

Li, Maria João; e sabe uma coisa? Não sei se isto é ficção, mas não me custaria nada a acreditar que fosse verdade.
Bem haja.