A palavra soou como um estrondo
embora tenha sido dita em voz baixa.
Ecoou na sala. Um eco de resposta
demorada que só se fez sentir quando todos se calaram e o silencio invadiu a
sala. Não sei se foi o eco da palavra, ou o silêncio que ela provocou que
fizeram mais ruido.
Como os líquidos escorrem pelas
paredes quando se atira uma garrafa contra elas, era assim que o eco escorria
pelo silêncio. Como se fosse sujo, mas não era, como se cheirasse a álcool, mas
não cheirava, como se fizesse lembrar qualquer coisa infame, mas não lembrava,
como se fosse deixar uma marca, um rasto por onde passava. E deixou.
Quem ouviu, deixou a palavra
escorrer, para melhor tomar consciência do que fora dito.
Quando o eco deixou de se ouvir,
o silencio manteve-se e todos os rostos se voltaram, uns para os outros.
Ironicamente, não se atreviam a olhar para a pessoa que dissera a palavra, como
se assim não a tornassem real, palpável e ainda tivessem esperança que tivesse
sido só impressão, uma má impressão. Preferiram olhar uns para os outros,
incomodados e confusos.
Ao aperceber-se da ação que a
palavra tomara, a sua autora repetiu a palavra, desta vez mais alto, para que
não voltasse a haver nem dúvidas, e repetiu para que não houvesse tempo de a
deixarem escorrer pela parede, a tentar perceber onde ir encaixar aquela
resposta.
Toda a vida, havia dito que sim.
Sim às ordens, sim aos desafios, sim às perguntas, sim às opiniões dos outros,
sim… sim… como se só os outros importassem.
Desta vez, experimentou o não.
Beatriz disse não a uma coisa tão simples, tão básica, tão triste e sentiu-se
completa, profunda, feliz.
E o que os outros pensavam disso,
não lhe importava. Que arranjassem mais alguém para dizer sim, porque agora ela
passaria a dizer não!
5 comentários:
Olá! Só agora comecei a ler os Desafios depois de um fim de semana atribulado! Adorei este pedacinho de escrita!"Como os líquidos escorrem pelas paredes quando se atira uma garrafa contra elas, era assim que o eco escorria pelo silêncio. " Isto é magnifico e o aproveitamento desta ideia foi tão bem exlorado. Pena que tivesse acabado, mas, lá está, a Beatriz assim quis!
Muito bom! Parabéns pelo texto.
gostei muito do misterioso implícito ;)
Texto muito, muito bom! Parabéns
Um texto misterioso, muito bom :)
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